publicidade
29/03/2022 16:00

Disputa na Fórmula 1 não ficará restrita a Ferrari e Red Bull

Escrito por Wagner Gonzalez
Jornalista especializado em automobilismo de competição

Foto: Red Bull

Ferrari e Red Bull dividem as vitórias até agora


Chega a ser tentador afirmar que Ferrari e Red Bull dividirão as vitórias na temporada 2022 da Fórmula 1 após duas corridas disputadas em um calendário de 22, talvez 23 etapas, em que os quatro pilotos dessas equipes aparecem nas cinco primeiras posições do campeonato.

Entre os construtores, a Ferrari lidera com 78 pontos, 40 a mais que a Mercedes e 41 sobre a Red Bull. É esse resumo que impede confirmar a ideia inicial do parágrafo. Além disso, a supremacia quase absoluta da McLaren na temporada de 1988 – quando Ayrton Senna e Alain Prost venceram 15 das 16 etapas da temporada – é algo fora de questão.

Sem dúvida a Scuderia de Maranello e a esquadra de Milton Keynes já demonstraram estar em um patamar superior às suas oito rivais, mas a presença de Lewis Hamilton no pódio do Bahrein e o quinto lugar de George Russell na Arábia Saudita garantem uma dose de esclarecimento para quem só enxerga aquelas duas equipes. Além disso, há de se lembrar as características de todas essas operações semelhantes, mas que são administradas de formas diferentes.

A Ferrari, por exemplo, tem Charles Leclerc como seu piloto número 1 e Carlos Sainz como um número 2 capaz de aproveitar a inconsistência até agora demonstrada pelo companheiro de equipe. No ano passado o espanhol marcou mais pontos e terminou à frente do monegasco. Além disso, o time italiano tem um currículo marcado por erros estratégicos e decisões equivocadas, sem falar no temperamento latino, algo que pode ser prejudicial frente à conhecida frieza de anglos e teutônicos. A maneira como Leclerc e a Scuderia jogaram com o desgaste de pneus em Jeddah é um exemplo disso.

A Red Bull não deixa a desejar quando se compara seu estilo de trabalho com a figura do touro que identifica o produto do seu controlador e principal patrocinador. A decisão do título de 2021 e o ataque de Max Verstappen na fase final da corrida de domingo exemplificam essas características. O segundo piloto do time, o mexicano Sérgio Pérez, já mostrou que é rápido, difícil de ser ultrapassado... e inconstante.

Não obstante a fama de saber cuidar dos pneus, é pouco provável que ele se torne um rival para o holandês, há tempos reconhecido como um patrimônio do time baseado em Milton Keynes, cidade famosa pelo número de run abouts (como são chamadas as rotatórias viárias na Inglaterra) nas ruas desta urbanização planejada.

Campeã de construtores nas últimas oito temporadas, a Mercedes tem seu pior início de campeonato desde que passou a dominar a categoria. Um problema aerodinâmico que começa a ficar conhecido com o termo “porpoising” ou “efeito golfinho” está na raiz do problema. Esse fenômeno restringe as possibilidades de George Russell, quarto colocado no campeonato, e do heptacampeão Lewis Hamilton, que em Jeddah não passou do Q1, algo raro, talvez inédito, em sua carreira.

Tal problema é consequência do desequilíbrio entre a calibragem de elementos da suspensão e a pressão gerada pela aerodinâmica. Na medida em que a velocidade aumenta, a diferença de velocidade entre o ar que passa sobre e sob a carenagem do carro cria o efeito solo, algo que comprime o monoposto contra o asfalto e aumenta a aderência. Quando essa pressão produz cargas maiores do que aquele que a suspensão consegue suportar, o assoalho do carro toca o piso e impede a passagem de ar nessa região, o que faz com que o carro “levante” e perca estabilidade até que o efeito volte a ser produzido. Nas transmissões de TV isso é perceptível quando se nota o capacete do piloto subindo e descendo em uma frequência assustadora.

Frio e calculista como lhe é peculiar, o austríaco Toto Wolff encara a situação de forma pragmática. “Temos que fazer um exercício de humildade, algo que nos fortalecerá. É extremamente doloroso não disputar as vitórias por causa de uma diferença tão grande de rendimento”, disse.

Quem conhece o modus operandi de Wolff sabe que seu exército de engenheiros e técnicos não está dormindo o mesmo número de horas dos últimos anos. No último fim de semana o carro de Sérgio Perez era o mais rápido na reta principal durante a prova de classificação, quando atingiu 335,1 km/h, exatos 10 km/h a mais que George Russell e Alex Albon, os mais rápidos entre os seis que usam o motor Mercedes. O fato que os quatro carros mais lentos – os de Nicolas Latifi , Lewis Hamilton, Lando Norris e Daniel Ricciardo, o mais lento, com 322,8 km/h – usam esse mesmo propulsor indica que a falta de potência pode estar relacionada com o déficit de desempenho.

Outra possibilidade é que o sistema de refrigeração demanda soluções aerodinâmicas ainda não encontradas nos carros dessas equipes. Nos testes pré-temporada a Mercedes avaliou diversas carenagens nas laterais da carroceria e acabou adotando uma solução peculiar que processa o fluxo de ar posterior às rodas dianteiras. A solução dos problemas dos alemães não está distante e não será surpresa se no GP da Austrália, marcado para 10 de abril, os carros da equipe apresentarem melhora significativa.

Os entusiastas do esporte só têm a ganhar com isso.

Leia mais colunas do autor